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Tribunal determina reintegração de supervisor discriminado por obesidade mórbida

Tribunal determina reintegração de supervisor discriminado por obesidade mórbida

Imagem ilustrativa / Divulgação

Decisão da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho destaca estigma social e reconhece discriminação em demissão de supervisor com obesidade mórbida

Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho proferiu uma decisão histórica, determinando a reintegração de um supervisor administrativo do Atacadão S.A., em São Paulo, após considerar sua dispensa discriminatória devido à obesidade mórbida e outras doenças associadas. Além da reintegração, a empresa foi condenada a pagar os salários do período de afastamento.

O supervisor, líder do setor de manutenção, alegou que sua condição de saúde, pesando mais de 200 kg e enfrentando problemas cardíacos, pressão alta, diabetes e depressão, resultou em discriminação após uma licença médica em 2015. O gerente indicou que sua demissão ocorreu devido à saúde e ao peso, alegando que ele “não servia” mais à empresa.

Obesidade é doença crônica

O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), Antonio Carlos Valezi, destaca que a obesidade é uma doença crônica e de tratamento contínuo.

“O estigma e a discriminação contra pessoas obesas não podem ser tolerados em sociedades modernas. A SBCBM reforça a importância do combate à gordofobia, indicando que o preconceito prejudica a saúde mental, o acesso ao trabalho e tratamentos adequados, além de comprometer as relações sociais”, comenta Valezi.

A decisão unânime do Tribunal Superior do Trabalho destaca a necessidade de respeito à saúde e dignidade do trabalhador, reforçando os princípios constitucionais contra a discriminação no ambiente de trabalho.

Embora a ideia de comer demais aliado a falta de atividades físicas possa parecer a principal causa da obesidade, evidências mostram que há uma linha mais tênue sobre a doença. As evidências científicas também indicam outras causas para a obesidade, incluindo a genética, fatores epigenéticos, fatores de origem alimentar, privação de sono, disritmia circadiana, estresse psicológico, desreguladores endócrinos, medicamentos e efeitos intra-uterinos e intergeracionais, entre outros.

Gordofobia e estigmatização da obesidade

Segundo a psicóloga Michele Pereira, coordenadora do Núcleo de Saúde Mental da SBCBM, a gordofobia reforça preconceitos e sofrimento daqueles que não atendem ao padrão estético

“O aspecto físico não interfere nas outras capacidades. Não há conexão direta sobre a doença obesidade e as capacidades cognitivas. Já o sofrimento emocional e a marginalização por conta da obesidade, sim, podem levar a prejuízo em outras áreas da vida. Precisamos encontrar meios de combater todas as formas de discriminação”, explica a especialista.

Para o psiquiatra Hélio Tonelli, que também integra o Núcleo de Saúde Mental da SBCBM, a sociedade ainda não se atentou que a gordofobia pode até ser comparado a crimes relacionados com preconceitos por raça, sexualidade e gênero e origem, o que equivale ao assédio moral.

“Grande parte das pessoas que atendo dizem que na infância, ou até na fase adulta, sofreram algum tipo de restrição social por conta da gordofobia e isso traz efeitos sobre comportamentos e até na saúde mental. Existem evidências que o preconceito e o estigma que o obeso sofre no dia a dia acabam ocasionando problemas emocionais que estimulam comportamentos alimentares disfuncionais como o comer emocional e a adição à comida, o que perpetua o ciclo da obesidade”, reforça Tonelli.

Entenda o caso

O juízo inicial e o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) inicialmente rejeitaram a tese de discriminação. No entanto, a decisão da Segunda Turma do TST destacou o estigma social enfrentado por pessoas com obesidade mórbida. A relatora, ministra Maria Helena Mallmann, afirmou que “o estereótipo criado em torno da doença é de que indivíduos com obesidade são preguiçosos e, portanto, menos produtivos, indisciplinados e incapazes.”

A advogada Miriam Knopik Ferraz, especialista em Direito do Trabalho, comenta que a demissão discriminatória é proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro.

“Quando comprovada a discriminação a demissão pode ser revertida e a pessoa retornar a trabalhar e, ainda, receber uma indenização. Foi esse o caso julgado recentemente no Tribunal Superior do Trabalho em que foi considerada a dispensa como discriminatória de um empregado, em virtude deste estar em estado de saúde caracterizado como obesidade mórbida. Dessa forma, a demissão de um empregado com ou sem justa causa só pode ocorrer dentro dos termos da lei e não pode ser baseada em estigmas, preconceitos, preconcepções e estereótipos que caracterizam a discriminação”, resume a advogada.

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